O MUNDO EM VOLTA DA CRIANÇA: COMO O AMBIENTE MOLDA O DESENVOLVIMENTO

Catarina da Isabel, Musicoterapeuta e Terapeuta da Fala

Como terapeuta infantil, observo diariamente a incrível capacidade das crianças de aprender, crescer e adaptar-se. No entanto, é crucial entender que esse desenvolvimento não acontece no vácuo. 

ambiente onde a criança vive e interage – seja em casa, na escola ou em contacto com a natureza – exerce uma influência profunda e multifacetada na sua aprendizagem. Um aspeto crucial, e muitas vezes subestimado, é o impacto desses ambientes no desenvolvimento da fala e da linguagem.

O Lar: O Primeiro Ninho de Aprendizagem e Comunicação

casa é, sem dúvida, o primeiro e mais influente ambiente da criança. É aqui que os alicerces do desenvolvimento são lançados, incluindo as bases para a comunicação. Um lar que oferece segurança emocional, rotinas previsíveis e afeto promove um desenvolvimento saudável do apego, essencial para a formação de relacionamentos futuros e para a vontade de comunicar. Quando os pais ou cuidadores respondem às necessidades da criança de forma atenta e disponível, estão a construir uma base sólida de confiança e auto-estima.

Para o desenvolvimento da fala, a qualidade das interações verbais em casa é primordial. Crianças que são expostas a uma linguagem rica e variada, através de conversas, leitura de livros, canções e brincadeiras que envolvem vocalizações e imitações, tendem a desenvolver o vocabulário e a estrutura frásica mais rapidamente. Responder aos balbucios e às tentativas de comunicação da criança, mesmo que “imperfeitas”, valida a sua voz e incentiva-a a continuar a praticar.

Além do afeto, a casa é um laboratório de descobertas. Brinquedos adequados à idade, livros, materiais de arte e a oportunidade de participar em tarefas diárias simples contribuem para o desenvolvimento cognitivo e motor, ambos interligados com a capacidade de comunicar pois somos seres em constante construção e sob a influência das experiências vividas e marcos do desenvolvimento alcançados. Uma atmosfera que incentiva a exploração, a curiosidade e a expressão individual, mesmo que com limites claros, permite que a criança desenvolva a sua identidade e autonomia, incluindo a capacidade de comunicar o que pensa e sente.

A Escola: O Mundo Além da Família

A transição para a escola marca a entrada da criança num novo ecossistema social e de aprendizagem. Neste ambiente, as crianças desenvolvem competências sociais cruciais, tais como: partilhar, cooperar, negociar e resolver conflitos. A interação com colegas e adultos é um motor poderoso para o desenvolvimento da comunicação. A necessidade de se fazer entender, de pedir, de partilhar ideias e de compreender as instruções dos outros força a criança a refinar as suas competências linguísticas.

Uma escola que promove um clima positivo, inclusivo e estimulante é vital. Professores que entendem as necessidades individuais dos alunos, que oferecem apoio e encorajamento, e que criam oportunidades para a aprendizagem ativa e exploratória, contribuem significativamente para o sucesso académico e para o bem-estar emocional da criança. A rotina escolar estruturada, juntamente com a exposição a novos conhecimentos e experiências, impulsiona o desenvolvimento cognitivo e a capacidade de resolução de problemas, elementos que estão intrinsecamente ligados à complexidade da linguagem. Atividades como contar histórias, fazer apresentações, participar em debates e realizar projetos de grupo são excelentes para expandir o vocabulário, a fluência e a capacidade de organização do pensamento em linguagem falada.

A Natureza: O Laboratório a Céu Aberto para a Comunicação Natural

Muitas vezes subestimada, a natureza desempenha um papel fundamental no desenvolvimento integral da criança, incluindo a fala. O contacto com espaços verdes – parques, jardins, florestas ou mesmo um simples quintal – oferece uma riqueza de estímulos sensoriais que não podem ser replicados em ambientes fechados. O cheiro da terra, o som dos pássaros, a textura das folhas e a vastidão do céu estimulam os sentidos e promovem a atenção plena, que são pré-requisitos para a concentração e para a capacidade de seguir conversas.

Brincar na natureza incentiva a criatividade, a imaginação e a resolução de problemas de forma orgânica. Trepar em árvores, construir abrigos ou explorar riachos desenvolve competências motoras globais, coordenação e equilíbrio, e muitas vezes inspira as crianças a descrever as suas ações, a nomear objetos e a inventar narrativas com os amigos ou com os pais. A natureza é um ambiente propício para a linguagem descritiva ("Que folha tão grande!", "A água está fria!", "Olha, um pássaro a voar!"). Além disso, a natureza é um excelente regulador emocional, ajudando as crianças a lidar com o stress, a melhorar o humor e a promover a calma – estados emocionais que facilitam a comunicação e a exploração vocal. Observar ciclos de vida, fenómenos naturais e a diversidade de seres vivos desperta a curiosidade científica e a consciência ambiental, e as crianças naturalmente querem comunicar o que veem e descobrem. A falta de tempo ao ar livre, por outro lado, tem sido associada a problemas de saúde física e mental, incluindo dificuldades de concentração e uma menor oportunidade para a comunicação. 

 

Em suma, o ambiente é um co-terapeuta silencioso no processo de desenvolvimento infantil, com um papel crucial e interligado no desenvolvimento da fala e da linguagem. Cada espaço e cada interação moldam quem a criança se torna e como ela se expressa. Compreender e otimizar esses ambientes é um investimento inestimável no futuro das nossas crianças, permitindo que cresçam resilientes, curiosas, bem ajustadas e capazes de comunicar eficazmente.

Como pais e educadores, temos o poder de criar esses ambientes enriquecedores.

Que pequenas mudanças pode fazer hoje para otimizar o ambiente da sua criança e estimular ainda mais a sua comunicação? 

 
 

@terapiaaoquadrado

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